Por que o cão com displasia de quadril muda o jeito de sentar?
- Felipe Garofallo

- 7 de out.
- 3 min de leitura
A forma como um cão se senta pode revelar muito sobre a saúde de suas articulações, especialmente dos quadris.

Em animais com displasia coxofemoral, é comum observar uma mudança característica nesse comportamento: em vez de se sentar com as patas traseiras alinhadas sob o corpo, o cão tende a abrir uma das pernas lateralmente ou apoiar-se de forma assimétrica, muitas vezes em uma postura que lembra uma “rã”. Essa alteração postural é um sinal direto da instabilidade e do desconforto articular causados pela doença.
A displasia coxofemoral é uma anomalia de desenvolvimento da articulação do quadril, em que há má congruência entre a cabeça do fêmur e o acetábulo.
Essa incongruência compromete a distribuição normal das forças de sustentação do peso corporal e leva à inflamação crônica, degeneração da cartilagem e dor. Como consequência, o cão passa a evitar posições que aumentem a pressão sobre o quadril — e o ato de sentar é uma delas.
Durante o movimento de sentar, o quadril precisa flexionar, rodar internamente e sustentar parte do peso corporal sobre a cabeça do fêmur.
Em um quadril normal, essa rotação ocorre de maneira suave e simétrica. Já em cães displásicos, a incongruência da articulação causa dor sempre que a cabeça femoral pressiona a borda acetabular.
Por isso, o animal busca uma posição alternativa: projeta uma das patas para o lado, reduz o ângulo de flexão e minimiza o contato doloroso. Essa adaptação postural é involuntária e serve para aliviar a dor durante o movimento.
Com o tempo, o hábito de sentar de forma assimétrica se torna um padrão de compensação biomecânica. O cão passa a apoiar mais peso em um dos membros, o que leva à sobrecarga muscular unilateral e ao desenvolvimento de atrofia e contraturas do lado menos utilizado.
Essa compensação, somada à inflamação contínua, acelera a degeneração articular e pode agravar a claudicação.
Além disso, o padrão de “sentar em rã” também está associado à instabilidade ligamentar. Quando os ligamentos e cápsulas articulares estão frouxos, a articulação perde sua contenção passiva.
Assim, o animal tenta “travar” o quadril com os músculos da pelve, abrindo as pernas para aumentar a base de apoio e evitar a subluxação da cabeça femoral. Essa postura é observada especialmente em filhotes e cães jovens com displasia ainda em fase inicial, antes mesmo de sinais radiográficos severos.
O diagnóstico é confirmado por avaliação ortopédica e exames de imagem, especialmente radiografias em projeção ventrodorsal estendida.
Em casos mais precoces, o exame físico — com palpação do quadril, observação de marcha e análise postural — pode ser o primeiro indicativo clínico da displasia. Identificar esse padrão de “sentar torto” é, portanto, um sinal de alerta valioso para diagnóstico precoce.
O tratamento depende do grau da displasia e da idade do paciente. Em casos leves, o manejo conservador com fisioterapia, controle de peso, fortalecimento muscular e condroprotetores pode trazer excelente resultado. Já nos quadros avançados, pode ser necessária intervenção cirúrgica, como osteotomia pélvica dupla (DPO), colocefalectomia ou prótese total de quadril.
Em todos os casos, quanto antes o diagnóstico for feito, maior a chance de evitar o avanço da dor e preservar a função articular.
Em resumo, o cão com displasia muda o jeito de sentar porque o corpo tenta proteger o quadril da dor e da instabilidade.
O que parece apenas um “jeitinho confortável” é, na verdade, um sinal clínico importante que revela o quanto o animal está adaptando seu comportamento para aliviar o desconforto.
Observar e reconhecer esse padrão pode ser o primeiro passo para oferecer qualidade de vida e tratamento adequado ao paciente displásico.
Referências bibliográficas:
Morgan, J. P., Stephens, M. B., & McCarthy, P. H. (2000). Canine Hip Dysplasia: Relationship of Radiographic Findings to Pathologic Changes. Veterinary Radiology & Ultrasound, 41(5), 474–484.
Nunamaker, D. M., & Newton, C. D. (2017). Textbook of Small Animal Orthopaedics. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins.
Sobre o autor

Felipe Garofallo é médico-veterinário (CRMV/SP 39.972) especializado em ortopedia e neurocirurgia de cães e gatos e proprietário da empresa Ortho for Pets: Ortopedia Veterinária e Especialidades.