Dor de crescimento em cães: Existe?
- Felipe Garofallo
- 20 de set.
- 3 min de leitura
A ideia de que cães possam sentir dor de crescimento é frequentemente levantada por tutores que percebem seus filhotes mancando ou demonstrando desconforto durante a fase de desenvolvimento.
A resposta é que, sim, cães podem manifestar dor relacionada ao crescimento, mas esse fenômeno não deve ser interpretado como algo “normal” ou esperado, e sim como manifestação de doenças ortopédicas específicas que afetam animais jovens em fase de rápido desenvolvimento ósseo.
Entre as principais condições que provocam esse tipo de dor está a panosteíte, também chamada de “claudicação migratória”.
Trata-se de uma inflamação que ocorre na medula óssea dos ossos longos, atingindo com maior frequência cães entre 5 e 18 meses de idade, especialmente de raças médias e grandes como Pastor Alemão, Golden Retriever, Rottweiler, Basset Hound e Doberman. O tutor geralmente percebe que o cão começa a mancar de forma súbita, sem que tenha ocorrido um trauma claro.
O mais curioso é que a claudicação pode mudar de um membro para outro ao longo de dias ou semanas, o que gera bastante preocupação. Ao exame, é comum haver dor intensa à palpação do osso afetado, podendo vir acompanhada de febre, apatia e perda de apetite.
Apesar de causar desconforto significativo, a panosteíte é considerada uma condição autolimitante, ou seja, tende a se resolver espontaneamente conforme o cão atinge a maturidade, embora possa ser necessário o uso de analgésicos e anti-inflamatórios durante as crises para garantir qualidade de vida.
Outra doença típica da fase de crescimento é a osteodistrofia hipertrófica, que acomete principalmente filhotes de raças grandes e gigantes entre 2 e 8 meses de idade. Ela se caracteriza por inflamação intensa nas metáfises dos ossos longos, regiões próximas às placas de crescimento, levando a dor, claudicação severa, aumento de volume e sensibilidade nas articulações distais.
Em quadros graves, o animal pode apresentar febre alta, prostração e até recusar-se a se levantar. Embora também seja uma doença que tende a regredir com o tempo, os episódios podem ser muito dolorosos e, em alguns casos, deixar sequelas como deformidades ósseas se não houver acompanhamento veterinário adequado.
Além dessas doenças, existem ainda as chamadas afecções do desenvolvimento articular, como a displasia coxofemoral, a displasia de cotovelo e a osteocondrite dissecante.
Essas condições estão intimamente ligadas ao período de crescimento rápido e costumam gerar dor crônica, claudicação e dificuldade para caminhar ou brincar. Diferente da panosteíte e da osteodistrofia hipertrófica, essas alterações não são autolimitantes e podem exigir tratamento cirúrgico para devolver qualidade de vida ao cão.
Portanto, quando um filhote apresenta dor ou dificuldade de locomoção, não se deve encarar isso como uma simples “dor de crescimento” sem importância.
Embora existam doenças autolimitantes que se resolvem com o tempo, o desconforto é real e precisa ser tratado, além de haver outras condições mais graves que, se não diagnosticadas precocemente, podem comprometer o desenvolvimento saudável do animal.
A avaliação clínica associada a exames de imagem é fundamental para diferenciar essas situações e indicar o tratamento adequado.
Em resumo, cães podem sim sentir dor durante a fase de crescimento, mas não se trata de algo fisiológico ou esperado como parte natural do desenvolvimento.
Logo, essas são doenças ortopédicas típicas da juventude que precisam ser reconhecidas e manejadas com atenção, garantindo conforto e bem-estar ao filhote em uma das fases mais importantes de sua vida.
Referências bibliográficas
Fossum, T. W. (2019). Small Animal Surgery. 5th ed. Elsevier.
Johnston, S. A., & Tobias, K. M. (2018). Veterinary Surgery: Small Animal. 2nd ed. Elsevier.
Sobre o autor
Felipe Garofallo é médico-veterinário (CRMV/SP 39.972) especializado em ortopedia e neurocirurgia de cães e gatos e proprietário da empresa Ortho for Pets: Ortopedia Veterinária e Especialidades.